Artigo elaborado: Dra. Ana Carolina Gonçalves de Melo
A atual Constituição Federal é comumente chamada “Constituição Cidadã”.
Isto porque assegura diversos direitos, dentre os quais podemos destacar: a dignidade da pessoa humana, a saúde, a educação, a moradia e o trabalho digno.
Pode-se dizer que alguns dos direitos constitucionais, como a moradia e o trabalho digno, são fontes de uma proteção muito relevante para o produtor rural: a impenhorabilidade da pequena propriedade rural.
Esta proteção está expressa no artigo 5°, XXVI da Constituição Federal que assim determina: “XXVI – a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento”.
Analisando o artigo de forma pormenorizada, atenta-se primeiramente à menção de que a pequena propriedade rural é definida em lei.
Neste sentido, a lei que define a pequena propriedade é a 8.629/93, que assim dispõe em seu artigo 4°, inciso II: “pequena propriedade – o imóvel rural de até quatro módulos fiscais, respeitada a fração mínima de parcelamento”. Este requisito é objetivo, excluindo da proteção legal a propriedade que possui mais de quatro módulos fiscais, uma vez que não se enquadra no conceito de pequena propriedade.
Ainda, voltando ao artigo 5°, inciso XXVI da Constituição Federal, além do requisito objetivo, a propriedade deverá ser trabalhada pela família. Trata-se de um requisito subjetivo, também previsto no artigo 833, inciso VIII do Código de Processo Civil.
A previsão deste requisito fundamenta-se no fato de que os pequenos produtores, via de regra, extraem seu sustento e o de sua família do trabalho em suas terras, produzindo e comercializando produtos agrícolas, fazendo desta sua principal fonte de renda.
Assim, esta constitui atividade essencial, não podendo ser afetada, sob pena de atingir diretamente o trabalho e o sustento básico de toda a família, por isso o artigo menciona a necessidade de que a propriedade seja trabalhada pela família.
Por fim, o artigo trás sua principal regra, dispondo que a pequena propriedade não pode ser penhorada para pagar dívidas da produção.
Esta proteção, qual seja, a impenhorabilidade da pequena propriedade rural, existe, pois, a atividade rural está sujeita a diversos riscos: clima, instabilidade econômica, pragas, entre outros. Quando essas dificuldades aparecem, manter a terra produtiva é o que garante o sustento familiar e a recuperação financeira.
Assim, a regra da impenhorabilidade assegura a propriedade e permite que a atividade continue e as dívidas possam ser honradas sem comprometer o patrimônio familiar.
Além das disposições legais, essa tese, fundamentada pela legislação acima e com a demonstração de cumprimento dos requisitos, é amplamente reconhecida pelos tribunais pátrios, de modo que tem sido aplicada com sucesso para impedir a penhora de imóveis rurais produtivos em processos de execução.
Desta maneira, o tema representa uma importante garantia constitucional, cuja finalidade é preservar o mínimo existencial do produtor. E, ao reconhecer a impenhorabilidade, o ordenamento jurídico brasileiro demonstra atenção aos princípios básicos da dignidade humana e a da função social da propriedade.
Assim, o pequeno produtor não precisa temer que as volatilidades referentes à produção afetem seu sustento, uma vez que a própria Constituição Federal, antes mesmo da ocorrência de algum problema prevê a proteção ideal ao produtor.